A MATINÊ
A máquina não sorriu ao entregar os bilhetes. O leitor automático liberou a passagem. O caminho era curto – o destino era mesmo ali, ao final do longo corredor.
O homem não se importava. Escolheu aquele que pareceu mais obscuro. Ao passar pela porta, não encontrou viva alma. Mas, conferiu os bilhetes; guiou-se pelas letras luminosas ao chão, pelos números de prata. Ao subir os degraus macios, ouviu seus próprios passos e a ausência dos saltos dela roçando as canaletas de metal.
Sentou-se e depositou ao seu lado o outro ingresso. As luzes diminuíram aos poucos – ninguém mais se interessara naquela história. Na tela, outros casais revezavam-se na tentativa vã de despertar no homem o interesse por suas vidas de fantasia. Suas vozes ecoavam nas paredes, altas demais, felizes em excesso.
O homem, alheio a tudo, olhos fechados, acariciava discretamente o pequeno pedaço de papel impresso e, gritando mentalmente o nome dela, tentava lembrar de sua primeira sessão de cinema.
[Robertson Frizero]
*Este conto foi citado pelo editor e escritor Sandro Bier no vídeo “Escrita de Contos – a Magia das Histórias Curtas”, do canal Café do Escritor, disponível no YouTube.