“ Foi quando estava apreciando sua xícara de café, que se tornou dependente do afeto daquele que povoava seus pensamentos. ”
O grafite deslizava sobre aquela folha em branco, esboçando uma nova história. E conforme a imagem ganhava forma, ela buscava colocar sobre o desenho, tudo o que sentia, como se quisesse esvaziar seu coração daquele sentimento que tanto a perseguira. É como se, através da arte, ela desejasse retirar qualquer afeição que sentia por ele.
Como se a incentivassem, os pássaros cantavam alegremente no lado de fora, e o sol adentrava, curioso e de mansinho, pelo cômodo em busca do novo quadro. E ela sorria, enquanto contava-lhes a sua poesia romântica, com um final nada feliz, pelas suas mãos.
Estava tão concentrada e orgulhosa de si mesma, ao vê-lo se transformando enquanto coloria, que, ao mover-se para colocar mais um pouco de tinta na paleta, esbarrou seu braço na xícara de café ao lado, manchando toda a sua criação com a bebida escura.
Seu sorriso desmanchou-se, conforme a frustração invadia seu peito, acusando-a de ter destruído uma ilustração tão bela. Se foi pela preferência em pintar sentada ou por ter colocado sua xícara perto demais do quadro, a culpa era dela, dizia sua consciência. E a culpa era dela em deixar aquele garoto povoar seu pensamento todos os dias, em uma falsa ilusão de um possível romance.
Em uma tentativa de impedir um surto, escondeu seus olhos, daquele desastre, com suas mãos, inclinando seu corpo na cadeira. Tentou manter-se calma controlando sua respiração, inspirando e expirando da forma mais calma que pôde. Teria conseguido se não fosse pelo cheiro forte de café, outrora sedutor, que provocava-lhe desconforto após perder seu frescor.
Levantou-se da cadeira e, com o auxílio de um pano, limpou a bagunça como pôde, pegando seu desenho, agora seco mas ainda manchado, e olhando-o detalhadamente, tentando enxergar algum indício de beleza para não desfazer-se dele. Sem chance. Amassou-o, com o coração doendo, e jogou fora.
Desmotivada, guardou suas ferramentas de arte, e, para relaxar, resolveu sair e dar uma volta pela cidade, após deixar sua casa sob a segurança de trancas e cadeados. Sem pensar duas vezes, rendeu-se a um copo de café em uma cafeteria. Não podia evitar, era tão viciante…
Pediu o de sempre: café com chocolate, sua combinação favorita. E quando estava saindo do estabelecimento, esbarrou em alguém que passava por ali desapercebido. Era ele.
Nada havia mudado, incluindo o sentimento que ela tentava esconder e descartar a todo custo, como uma pintura malfeita. Eram os mesmos olhos escuros, escondidos por um vidro, que a cativaram quando se conheceram.
Foi quando derrubou aquela combinação de dois vícios, em si mesma e no rapaz, ao se esbarrarem, que ela percebeu, em seu olhar poético, o aroma sutil do amor inebriá-la outra vez.
Curadoria: Lourenço Moura
10 respostas
Muito legal adorei, duas combinações adoráveis.
Meus parabéns 👏👏👏👏👏😍📚🖊️
Aaaah, fico muito feliz que tenha gostadoo 😍☕
Bravo! 👏👏👏👏👏👏
Conto maravilhoso, extremamente sensível e combina perfeitamente com o blog.
Muito obrigada 😍☕
Linda, romântica e impactante short story. Parabéns!
Muito obrigada por seu comentário!
Fico feliz que gostou ❤
Que texto lindo Sandy! O enlevo de um coração apaixonado e em consequência, meio atrapalhado. O canto dos pássaros, o sol entrando pela janela enquanto ela pinta, um momento de frustração compensado por um encontro romanticamente atarantado e o aroma de café e chocolate que permeia o cenário. Poesia em prosa!
Comentários assim me estimulam a escrever mais! Muito obrigada 😍❤
Texto com aromas, sabores e sentimentos. Parabéns, Sandy!
Muito obrigada por seu comentário!
Fico felizz ❤